segunda-feira, 18 de março de 2013

Escolinha de Roça



Teve uma vez que eu tava com uma barriga-ruim de lascar. E tava tão ruim, mas tão ruim, que acharam por bem me levar à cidade. Nem precisa dizer que ir a cidade por doença era coisa rara. Levaram-me à Paraisópolis, na farmácia do João Cabral. Até que gostei de andar de jipe. Mas estradas soquentas com barriga-ruim não combinam nada. Tivemos que ir à na casa da Tia Rosinha para eu me assear. Lá ela recebia a visita de uma amiga e seu filho, menino com idade mais ou menos igual a minha. Lá falando com ele, ele ficou surpreso com algo que para mim era natural. Que eu estudava numa escola onde toda a molecada de primeira a quarta série ficava junta, em bancões de tábua. A professora dividia o quadro em quatro, e cada série tinha o seu pedaço, e sua atenção exclusiva apenas às vezes. Quando tratava com uma série, as outras estavam envolvidas em tarefas. "Que coisa mais atrasada", o moleque observou em tom deboche. "Como é possível? quando ela está explicando para uma série, a outra não se atrapalha com o barulho?". Eu disse não. Temos que nos concentrar em nós e nossa tarefa. No jardim o jardineiro não cuida de todos os tipos e tamanhos de flores? Ele só dá uma forcinha. Uma água... Uma afofeadinha na terra... Um esterco... O arranque das pragas sem-vergonha. No mais, é com a planta. Ele não precisa ficar em cima delas o tempo todo. São elas que têm que crescer. Na nossa escola é igual. A professora pede para copiarmos uma lição, realizar certas operações, é nós que temos que fazer, ali estamos crescendo. Para que professora em cima o tempo todo? Ele ficou surpreso e não achou boa a comparação. Mas hoje, pensando, foi uma explicação bastante avançada para a minha idade. Aquilo realmente era estranho, mas pensando bem, isso de estudar meio sozinho, parece coisa bastante adiantada, ao invés do contrário. A professora era mais para que não perdêssemos o foco, a concentração, de resto era conosco. Quando na terceira série eu passei para uma escola comum, quando me mudei com a família para Cambuí, e a Dona Leila me falou na frente de todos "nossa, mas você está muito adiantado para a série", eu fiquei vaidoso e entendi como grande elogio. Quis que a minha professora da roça tivesse ouvido aquilo. Quis que aquele menino de Paraisópolis tivesse ouvido aquilo.

Nenhum comentário:

Postar um comentário