terça-feira, 29 de setembro de 2020

2020

venho receoso
a noite já cai, suja
dos postes escorrega uma
luz embaçada e vaporosa
mariposas giram giram
como sentissem dor
como quisessem fugir
mas não soubessem
para onde
 
ao longe passam pessoas
mascaradas apressadas
vão como enfeitiçadas
como não vissem nada
as luzes doentes
me fazem fantasiar
um franzido de maldade
nas sobrancelhas delas
 
uma freada tensa longe
eu olho olho olho
não vejo nada nada
uma mariposa bate em mim
meu coração salta
acelero aterrado
não gosto dos ecos
dos meus passos
parecem contagem
regressiva para algo ruim
 
de debaixo do viaduto
penso vir uns gritos
mas são inumanos
não tenho coragem de
de parar para olhar
mesmo porque passos
que vem do beco
me fazem acelerar
 
corre um brisa ácida
confiro minha máscara
uma janela expulsa uma
ponta amarelada de cortina
que agitada parece querer
me assombrar ou alertar
 
acelero, acelero
peito apertado
minha boca parece não
ser capaz de buscar 
o oxigênio que quero  
que saudade da minha terra
que saudade de tudo
como era

sábado, 26 de setembro de 2020

curto

ando sem apetite
para bulícios
nada disfarçado
de algo logo ali
 
na usura das
vaidades
quero é mais
atalhos
  
o caminho
do qual fogem
é o que busco
 
com tempo
para risadas
cafés quentes
e alvorecer de
corruíras 

quarta-feira, 23 de setembro de 2020

De Quando Ainda Não Me Existia Luciana

ainda vai longe a festa da cidade
mas já estou sonhando com Luciana
a tarde passearemos na praça
alegres e as mãos dadas
os amigos terão inveja
as meninas torcerão o nariz
cochicharão quem é essa
tomarei Luciana pelas mãos
tomaremos um sorvete
nosso primeiro beijo será
perto do coreto, e gelado
nossos destinos estarão selados
viverei feliz com Luciana 
espero que seja bonita
mas se não for tão linda
nem ligo
bom coração haverá de ter
e também riso fácil
daremos voltas e voltas na praça
as mãos dadas
ela gostará de mim
mesmo que eu não seja tão forte
mesmo que eu não seja tão calmo
mesmo que eu não seja bonito
mesmo que eu seja estressado
mesmo que eu seja exagerado
mesmo que eu seja medroso
ela sorrirá dos meus defeitos
abraçara-me pedira calma
nem sei se a conhecerei Luciana
nesta festa da cidade
mas se não, tudo bem
tem o Natal
depois a Semana Santa
a outra festa
não tenho pressa
se bem que, confesso
seria bom que ela viesse logo
tenho tanto para dividir
tanto  para contar
tem os beijos que não quiseram receber
ela haverá de querer
ah meu Deus, quero apertá-la tanto
ela haverá de gostar de tudo
sempre sorrindo
onde estará minha Luciana
já andei confundindo-a
com outras por aqui
como ela será
terá sardinhas no rosto
espero que sim
acho um charme
será que também gostará raspa de arroz
qual será a cor dos olhos dela
será da cor que Deus quiser
faça chuva faça sol eu vou
na próxima festa, digo
tenho medo que Luciana vá
e eu não esteja lá
até pedi para mamãe comprar-me
uma camisa laranja-sol, na Ica
quero ser visto
não quero Lhe apressar, Deus
mas se for nesta festa
juro que levo em Aparecida
uma foto minha e de Luciana
ponho aos pés da Santinha
preciso muito das cores
que Luciana me trará
para o mundo

sábado, 19 de setembro de 2020

Tio Andrelino

O Tio Andrelino
Com sessenta e cinco
Disse que queria
A idade do pai Tonico
 
Com os oitenta e dois
Já na outra esquina
Mudou para os noventa
Da mãe Leontina
 
Agora já próximo
Da idade da mãe
Muda novamente
Diz que quer mais
 
Que é para frente
Que temos que ir
[sorri sorri]
Quer os cento e oito
Da Tia Nair

Bem se vê
Como é
Já-já quer os
Novecentos de Noé


Viva viva viva
O Tio Andrelino
Sempre alegre
Como um menino

Notando tucanos e
esponjinhas rosas
na previsão de tempo
ele sempre arrasa
[e a tia Alice
concorda]

segunda-feira, 14 de setembro de 2020

Hesitação

não sabe se vai
se não vai
ela não sabe
não sabe
não vai
sua vida 
é isso
um eterno
não ir
agora vou
não vou
vou 
não vou
por que não fui?
por que não fui?
teme a tristeza
não quer sofrer
mas pensa bem
já não está tão
triste assim?
uma eterna
sensação 
de navio que
evita o mar