quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

o desgosto



               Num certo dia acordei bem mais cedo, lá pelas seis e pouco da manhã.  Tinha eu então uns quatorze anos.
               Chegando à cozinha deparei-me com o vovô Lazo Doca todo agitado. Ele estava todo suado e tomava muita água. É que trabalhava numa roça de milho plantada ao quintal desde as quatro e meia, segundo ele.
               Meio brincando lhe falei que trabalhar demais mata a gente. Mas ele, me olhando sério, disse que o trabalho não mata, mas sim o desgosto.
               De fato o desgosto matou-o poucos anos depois...

quarta-feira, 3 de novembro de 2010

O MENINO E A SERPENTE...


Lá vai o menino, com uma serpente no pescoço, caminhando, numa floresta hostil, onde as noites são mais escuras que a escuridão, e frias, feito à alma dos insensíveis.

Os dias, também são escuros, quase tanto quanto à noite, um pouco mais cálidos é bem verdade que se diga, mas não muito.

O pobre nunca saiu daquela floresta, a ingenuidade nela faz-se presente, criança, inocente, só quer coisas boas, brincar, fazer amigos, sorrir, comer mel... De regra nada disto acontece... É incompatível com aquele lugar traiçoeiro e agressivo.

No pescoço leva, enroscada, aquela horrenda serpente, não é sua amiga, muita vez o pica, mas crescer com ela, fez com que seu corpo se tornasse imune, aquele veneno não o mata, somente o faz sentir dor, muito dor.

Apesar da sua ingenuidade, o menino intui que a serpente o protege, não por que quer, mas somente pelo fato de estar emaranhada em seu pescoço faz com que o respeitem um pouco, temem-na, sem ela, ele não duraria nem cinco minutos.

Às vezes ele chora, comumente, quando ela dorme, pois se está acordada poderia irritar-se e o mordê-lo, e aquela dor é realmente terrível.

Às vezes ele tem inveja dos animais que vê, parecem ser tão felizes, pois não registram fatos passados e nem tem expectativa para o futuro, isso faz com que vivam cada momento, numa sensação linear, sem comparações com outras situações, assim, vivem em constante felicidade. Que inveja...

Uma linda borboleta azul o acompanha vez em quando, é sua amiga. Teme um pouco a serpente, que, não obstante a amizade com o menino, não tem a menor consideração por ela. Qualquer vacilo e ela dá seu bote, para feri-la ou mata-la, tanto faz.

A bruta da companheira do menininho, como ele, alimenta-se de umas frutinhas de duas grandes árvores, que ficam próximas de um lago, ao oriente, na parte um pouco mais clara da floresta.

A árvore mais nova dá um fruto maior, contudo um pouco mais ácido, e esta acidez às vezes irrita a serpente, não o menino.

A árvore mais velha dá frutos menores, porém, muitas vezes mais adocicados. Sendo estes, a única coisa em toda aquela floresta escura que é capaz de acalmar a aquela insensível. O menino a procura com mais freqüência.

Às vezes, ele se olha nas águas turvas do lago, se vê, como a imagem o deforma um pouco, se acha feio, pensa ser este o motivo porque é infeliz. Não entende porque a borboleta azul sente algum carinho por ele, pois, é tão feio, não merece tal sentimento nobre.

Ele já percebeu, que a borboleta azul traz em sua gualdrapa uma daquelas frutinhas doce, e quando a danada está meio atacada, joga aquele pingo de mel em sua garganta. Então a coisa-ruim acalma-se um pouco.

O pequenino tolo vive seus dias, na esperança de que encontre um lugar, onde possa sentir o calor do sol, onde a água cristalina desça calmamente, dançando entre as pedras brancas e redondas, onde os sabiás gorjeiem nas tardes de primavera, e uma brisa leve acaricie sua pele, neste dia, abandonara a serpente, ficará para trás, não haverá mais ameaça, então aqueles seus dias ficarão esquecidos, como um sonho ruim numa noite mal dormida... Pobre menino, sempre pensa que este lugar está atrás da próxima montanha... Que engano.

Lá vai um menino com uma serpente no pescoço, caminhando, numa floresta hostil.

sábado, 23 de outubro de 2010

Shekina-santos



Os homens, enquanto seres físicos, são, por sua natureza, essencialemente visuais. Partindo disso Deus orientou aos homens que fizessem a Arca da Aliança, o objeto em que as tábuas dos Dez mandamentos teriam sido guardadas.

Segundo está relatado na Bíblia, Deus se fazia presente nesta Arca, o que os Judeus chamavam Shekinah ou presença de Deus.

Aquela arca não era Deus, mas olhando-a, era como se Deus estivesse ali. Era uma espécie de chave, um algo físico que ligava mentalmente uma sensação de presença Divina.

Alguma semelhança com os santos?

quinta-feira, 21 de outubro de 2010

saudades






Tão bela na montanha...
Tão pertinho do céu...
Meu coração se assanha!
Ah, “Capela” sonho meu!
Brisa branda a soprar,
Consolação vá refrescar,
E só me deixe aqui...
Lembranças, dê a todos lá.
E empós desande cá,
Contar tudinho a mim.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

ah, menino!


Oh! Amiguinho meu,
veja só o destino,
nos dá, e empós tira.
Até parece mentira!
Morrer não dá medo,
mas sim o desprezo.
O que dói na velhice,
não é o que lhe existe,
mas o que já existiu.
Ah! Isso dói viu.
Ao longe dos queridos,
digo-lhe é mui sofrido.
Não aflige a falta de vigor,
mas dos amigos o calor,
dos manos as boas prosas,
dos avós as muitas histórias,
dos pais o terno sorriso,
do mundo o ar de paraíso...
Ah, menino, menino!
Em meio a esse desatino,
mais, escrever já não consigo.
Um dia entenderá o que digo.
Quando for estranho no ninho,
em meio há cinzas,
tão sozinho...

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Já ouço o grito


Nas velhas ruas da metrópole,
Umas tantas pedras tortas,
Tentam Esconder.
A verdade fúnebre do que fomos,
E, embora tanto refutemos,
Tornaremos a ser.

Na poeira destes tão velhos tortos,,
O torto lúgubre deste jeito,
É de fazer tremer.
Pela desatenção ao grito do dragão,
Que a todos Anunciará,
Um novo a acontecer.

Na igreja de tão antigos sinos.
Uns tantos joelho rotos,
Entortam-se em vão.
Já que o velho senhor pedra,
Asquerosamente se infiltrando,
Destila o seu anti-pão.

É melhor que acredite,
O dragão anunciará,
E antes que pisque,
Tudo se transformará.

Por sorte os meninos tão ingênuos,
alheios a impregnante treva,
Entrevêem flores na praça...
E ver flores abranda, mas não tanto,
E assim segue o ponto:
Até onde vai esta graça?

O que sobrará disso tudo?
O que realmente vale a pena?
Responda-me, por favor...
Este povo todo, por aí se movendo,
Nem aí, se alegrando...
Até onde vai este calor?

Nem sei se é dia ou noite...
O quão perfeito é este quase-perfeito...
Por que a apreensão.
O que penso que sei é que,
Aqui, do alto da janela triste,
Já ouço o grito do dragão.

É melhor que acredite,
O dragão anunciará,
E antes que pisque,
Tudo se transformará.