domingo, 11 de fevereiro de 2024

Coisas da estrada

Lá de casa, desacorçoado das mesmices das envolturas, eu ia espiar a corcova da estrada, lá embaixo. Um anzol a me atrair. Algo crescia dela para o mundo. Um crescer que me descrescia pra ainda mais pequeno. Era esquisito, misterioso, desafiador. Às vezes vinha um carro. Eu crescia os olhos. Primeiro, o ruído. Num anúncio de devir. Eu ajustava os ouvidos. Depois, o carro. Aquela coisa misteriosa que avança sem o traçado dos bois. Depois, sobrava a poeira, alardeando que algo se foi. Eu sobrava limpando os olhos, trancado de uma sensação pesada de passado. Um abafado se foi pra sempre. O céu passarinhava-me gorjeios. Eu atinava que queria me dizer que eu deveria buscar outras imagens. Viajar que nem os passarinhos, nômades. Um dia vou, vou, pensava, já tremendo de medo de deixar de ser-me. Um dia fingi-me corajoso. Fui. Topei com variadas extravagâncias. Forças desejantes arrastaram-me pra vales, montanhas e ainda além. Vi gentes tão esquisitas! Como sou descompetente pra exageros, remendei-me o quanto pude de normoses. Às vezes atino que a madrugada brisa-me que devo regressar. Já dormi nisso. Mas é questão sem inteireza. Confesso que deslembro o caminho da volta. Suponho que qualquer algo se entupiu em meus poros. Desconstruí-me na estrada, conforme temia. Desconfio que a poesia não habita mais meus olhos.