papai foi a vila
preparou com capricho
o cavalo carrapicho
foi limpar arroz
comprar sal
linha e retrós
mamãe ficou comigo
já é noitinha
a lenha estrala em labaredas
e o feijão já cheira gostoso
mamãe de ouvidos abertos
busca pelo tropel do carrapicho
late o cão Rex
mamãe sente o peito apertado
um curiango pia longe
na mente de mamãe
farfalham preocupações
olha, escute o tropel
não, não acho que não
será será, será
mamãe abre a janela
espia lá fora
o vento faz tremer
a cortina de chita
é a chaminha da lamparina
mamãe se abraça se agita
é capaz que sejam bezerros
ou vento nas bananeiras
mamãe cresce os olhos
a lua já apareceu
e cadê o Tadeu
Ê Tadeu, ê Tadeu
deve estar de conversa
com o Zé Pereira
se deixar fica de prosa
a vida inteira
aí tropel outra vez
ou será o vento de novo
não... agora é mesmo
ela espia lá fora
sente o cheiro do roçado
no instante de dúvida
mas seu rosto se acende em riso
o tropel do carrapicho
enche a noite de ritmo
até que enfim
até que enfim
não gosto que seu pai
a noite por aí
Deus que livre e guarde
já pensou se cai
ela suspira
faz em nome do Pai
papai aparece
como um herói da noite
a longa capa cinza
cobre um corpo de homem
mas abaixo do chapéu escuro
vê-se o rosto
de menino tímido
papai lança sobre a mesa
um o pacote
sem dizer nada mamãe
se abre em riso
toda vez que vai a vila
papai trás para nós
um pacotinho com balas
mamãe adora essas balas
adora esse carinho
como beijinhos
açucarados
afoita ela desembrulha
a bala que lança a boca
com a língua vai rodando
a bolotinha açucarada
recebe nas balas
o beijo que meu pai não deu
contido por um jeito
tão antigo
na chaminha da lamparina
o menino vê um formato
de coração