Ele chegará ressabiado, pisando
macio. Será como numa casa de sítio, toda rodeada em gramados, flores e
pequenas árvores. Será noite; mas ao céu nascente já haverá sinais daqueles
primeiros afogueados da madrugada. Ele entrará inseguro. Será um choque. Todos
baterão palmas e gritarão vivas. Também darão muitos abraços de boas-vindas,
especialmente os pais dele. Quantos amigos e parentes. De alguns ele até já teria se
esquecido. Ele tentará se explicar, muito ansioso. Os avós falarão das
gracinhas dele, em criança. Ele continuará tentando se explicar. O irmão dele
colocará um dedo nos lábios dele, para que pare com as explicações, como a
dizer: aqui isso não é preciso, todos sabemos. Então ele se
acalmará. Sentirá o cheiro do refogado no fogão à lenha. Será o cheiro da comida
da avó. Ele havia se esquecido daquele cheiro. Como gostava da comida dela.
Mais tarde, depois de comer, ele se deitará numa rede lá fora. Pedirá licença a
todos, falará em cansaço. Todos entenderão. Sabem da dificuldade dessa viagem.
Lá na rede, ainda escutando o burburinho daqueles seus parentes já falecidos,
ele pensará: porque tive tanto medo.
sexta-feira, 31 de agosto de 2018
quarta-feira, 29 de agosto de 2018
Eu-te-vi
eu-te-vi
eu-te-vi
grita o
passarinho
dissimulados
os homens
dizem ser
bem-te-vi
o nome
eu-te-vi
é passarinho
poderoso
capaz de ver
até pensamentos
que pensamos
não pensar
lá, onde somos
nos mesmos
embaixo
das nossas
fumaças
brada o
eu-te-vi pra
lembrarmos
quem de
fato somos
Isso não
pra nos
apequenar
mas pra
que nós
mesmos nos
apequenemos
e não pra
chorar
mas sim pra
nos unirmos
a busca
do possível
eu-te-vi
grita o
passarinho
dissimulados
os homens
dizem ser
bem-te-vi
o nome
eu-te-vi
é passarinho
poderoso
capaz de ver
até pensamentos
que pensamos
não pensar
lá, onde somos
nos mesmos
embaixo
das nossas
fumaças
brada o
eu-te-vi pra
lembrarmos
quem de
fato somos
Isso não
pra nos
apequenar
mas pra
que nós
mesmos nos
apequenemos
e não pra
chorar
mas sim pra
nos unirmos
a busca
do possível
sábado, 25 de agosto de 2018
recomeço
quando lá atrás dos
montes o menino sol
puxa o cobertor
empoeirado da noite
e lança à madrugada
apassarada a ponta
do seu manto morno
e rosado
deitando açúcar
e goiabas silvestres
à quentura escura
da panela de ferro
então despreguiço-me
para o que há de vir
tentando assoprar
as brasas velhas
e deitar mel aquelas
trincas ressecadas
pelo intragável
dos outros dias
terça-feira, 21 de agosto de 2018
Rasgo
Na gente abre-se
Um rasgo a brasa
Aí vem aquele sujeito
Diz é vida que segue
Ele está num bom lugar
Está melhor do que nós
Meio que é isso mesmo
Não há palavra que acuda
Mas o carão do sujeito
Não esfumaça sua indiferença
Logo já fala do seu carrão
o sujeito raso, ô Pai
Quem realmente sente
Fica um tempo com os
Músculos do rosto
Travados para as
Risadinhas fúteis
Um rasgo a brasa
Aí vem aquele sujeito
Diz é vida que segue
Ele está num bom lugar
Está melhor do que nós
Meio que é isso mesmo
Não há palavra que acuda
Mas o carão do sujeito
Não esfumaça sua indiferença
Logo já fala do seu carrão
o sujeito raso, ô Pai
Quem realmente sente
Fica um tempo com os
Músculos do rosto
Travados para as
Risadinhas fúteis
segunda-feira, 13 de agosto de 2018
balas
e salgados da minha mãe
sem por nem tirar de bons
mas meu pai quando ia à cidade
comprava para nós umas
balas sortidas e coloridas
vinham empacotadas àqueles
papeis feitos de jornal moído
que costumavam embrulhar pão
se fosse a cidade 5 vezes a semana
cinco pacotes de balas nos viriam
lá da venda do Vardinho
aquilo era mais que doce para nós
por meu pai sempre tão quieto
àquelas balas falavam
sábado, 11 de agosto de 2018
Pasárgada
No fim da tarde
Ofegante ia, ia
Ouvindo os baques
Das passadas minhas
Às vezes um chute
Numa pedrinha
A pasta com cadernos
Batendo cadenciada
As pernas firmes
O sol já baixiiiinho
Eu comia uma fragaia
Limpava a boca
Corria, corria
Lá pela descida
Do Alto da Coruja
Os sinos da Ave-Maria
O sol se desbotando
Mas o meu espirito
Se arregalando
A cidade já bem perto
Hoje o que será
Hoje o que será
Soprava um vento
Trazia um cheiro
Um cachorro latia
Uma coruja piava
Já escurecia
Eu encontrava alguém
Abanava-lhe uma mão
Pensava: agora que
Vai ficar bom
E ele já voltando
Um passarinho perdido
Voava alto, alto
Minha mente voava
Mais alto ainda
Oh tempo colorido
Eu morava em Pasárgada
E não sabia
terça-feira, 7 de agosto de 2018
Disfarce
Aquela voz em mim
Gritando isso e aquilo
Eu devo saber
Sei muito pouco de mim
A vozinha doce que eu
Muito bobinho
Penso ser meu coração
Dizendo: não é contigo
Não, não. Não é contigo
Pode uma falha minha
Disfarçada de amiga
(Sabe aquilo de lobo
Se fazendo cordeiro?)
Devo desconfiar de todos
Principalmente de mim
E mesmo que o Renato Perim
Diga isso não precisa dizer
Não resisto e escrevo
A culpa pode ser minha sim
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