sexta-feira, 31 de agosto de 2018

Depois da viagem


Ele chegará ressabiado, pisando macio. Será como numa casa de sítio, toda rodeada em gramados, flores e pequenas árvores. Será noite; mas ao céu nascente já haverá sinais daqueles primeiros afogueados da madrugada. Ele entrará inseguro. Será um choque. Todos baterão palmas e gritarão vivas. Também darão muitos abraços de boas-vindas, especialmente os pais dele. Quantos amigos e parentes. De alguns ele até já teria se esquecido. Ele tentará se explicar, muito ansioso. Os avós falarão das gracinhas dele, em criança. Ele continuará tentando se explicar. O irmão dele colocará um dedo nos lábios dele, para que pare com as explicações, como a dizer: aqui isso não é preciso, todos sabemos. Então ele se acalmará. Sentirá o cheiro do refogado no fogão à lenha. Será o cheiro da comida da avó. Ele havia se esquecido daquele cheiro. Como gostava da comida dela. Mais tarde, depois de comer, ele se deitará numa rede lá fora. Pedirá licença a todos, falará em cansaço. Todos entenderão. Sabem da dificuldade dessa viagem. Lá na rede, ainda escutando o burburinho daqueles seus parentes já falecidos, ele pensará: porque tive tanto medo.

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