sábado, 28 de julho de 2018

Cintilar

a esposa não terá
mais o marido
o filho, o pai
o neto, o avô

no ar a pergunta
sem resposta

bom seria os pais
vivos para sempre
mas seria bom pra eles?

lembranças de outros
tempos boiam a mente
de quem fica

a mão na lápide
sente o frio que indica
não haver ninguém ali

a pergunta sem resposta
voa a mente como um
corvo que ronda

uma brisa corre
um cão ladra longe
quem se foi não
sentira mais o brisa
nem ouvira os cães

suspiro

até breve... até breve...
será?

as palavras embolam
e não é fácil deitar o
sentimento amargo
em texto

um sono sem volta
será descanso?

será que eu deveria
ser mais leve?
esperança além da dor

São cinzas muitas ácidas
a pergunta sem resposta

o marido dorme
o pai dorme
o avó dorme

não na lembrança dos
que ficam

... até quando?

tudo não passou de
um cintilar de luz

sábado, 7 de julho de 2018

Incansável


Ele gosta de mudanças
Embora finja que não
Destrói construindo em cima
É impiedoso é inquieto
Se faz respeitoso
Quando altera aos pouquinhos
Disfarçado, sorrateiro, insosso
Não sei das razões dele
Além da vaidade de querer
Sempre deixar sua marca
Não me conformo que tenha
Dado fim aquele casarão verde
Da minha infância
Falo do PRESENTE, lógico
Se eu chegasse à minha avó
Àquela tarde em que ela parou
Com o terço e veio me servir
Café com bolo de fubá
Enquanto o canarinho
Cantava a janela
E dissesse que aquilo tudo
Ela, a casa, o café, o bolo,
O bule, a janela, o canarinho
Seria destruído
Ela riria de mim
Falaria lógico que sim
Mas um lógico meio
Não acreditando
Como fosse algo dali
Há dois milhões anos
Não demorou um isso
É o Incansável já encheu
Ali de coisas novas
Coisas das quais foi
Logo enjoando e já
Trocando por coisas
Mais novas ainda
Ele não sossega
Ele não se apega
Ele é um trator...