sábado, 30 de janeiro de 2016

A MENINA DO VESTIDO VERMELHO





Imagine uma casa cheia, um povão falando, o tilintar de copos e talheres. Contudo uma menina se sente só. Pensa que se desaparecesse ninguém lhe daria pela falta. Ela imagina o Espaço sideral como um local frio, sem cheiro, quieto, escuro. Um nada. Eternamente, um nada. E também é assim que ela se sente por dentro. Um nada. Eternamente, um nada. Veste o vestidinho vermelho que foi da irmã mais velha. Acha-o tão bonito. Até fez em si umas tranças num lado dos cabelos, para combinar. A irmã fazia tanto sucesso com o vestidinho. Porém ninguém lhe fala do vestido, ninguém lhe fala das tranças. Ela come e come. O que mais lhe resta numa festa onde lhe veem sem enxergar. Cai um pedaço de bolo grudento em seu vestido. Mandam-lhe que se limpe. Ela fica surpresa por ser vista. Faz um teste. Vira intencionalmente um copo de refrigerante na mesa. Veem-na. Gritam que preste atenção. Depois outro teste. Estoura a correia da sandália por querer, embora fazendo parecer acidente. Veem-na outra vez. Uma tia gorda ainda diz com uma boca cheia de ar, bufando, ô menina desastrada. Ela gosta de ser vista, dos olhos das pessoas lhe mirando. Não lhe é comum. Excita-lhe. Dá-lhe sensação de existência. Algo quente e agitado. Bem diverso do gelado do Espaço sideral. Ali ela aprende como fazer para ser vista.  

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