Às vezes eu abria um
risquinho de janela, durante a noite. O ranger das dobradiças da janela de
tábuas era aterrorizante. O mundo lá fora era de arrepiar. Um sopro frio. Uns pios diferentes,
principalmente do urutau. No brejo os coaxares mais lembravam gritos. Os cachorros
corriam em volta da casa, desesperados, como a protegessem de um monstro nas vizinhanças. Tinha vez que eu escutava até baques de tiros. Meu pai falava em
caçadores. Eu não me conformava de alguém ter coragem de sair de casa a noite,
ainda mais para adentrar matas. Um dia meu pai preparava um cabo para machado e
me chamou. Olhe aqui. Disse-me. Com um indicador duro mostrou chumbos cravados
na madeira que vinha da matinha do nosso sítio. Então era verdade. Depois disso o meu medo de onça piorou. E dez
vezes maior, à noite. Presença de caçadores para mim significava presença de
onça. Acaso o tio Toninho não matou uma? Um medo que me tolhia o prazer de
contemplar o rendado brilhante do céu noturno, que na roça é muito, muito,
muito mais lindo. Mas com a tramela girada, janela fechada, eu me sentia muito
bem e seguro. Sabe aquela sensação gostosa de que nada, nada poderá nos atacar.
De que nada, nada nos faltará e para isso não precisamos fazer nada. Então...
Não há riqueza maior. Eu tinha pena era dos bichos lá fora, sem um lugar seguro
para passar a noite. Aquela casinha normal, tijolinhos débeis assentados em
barro, um telhado que nem forrado era, a mim era bolha de proteção graças ao
meu pai. Aquele esmalte de superproteção era coisa dele sempre presente, com
suas histórias, com o rádio nas músicas sertanejas, brincalhão, sério. Quando
ele saía, no máximo na boquinha da noite já ouvíamos em festa o tropel do
cavalo. Era ele que voltava de alguma comprinha. Certeza que viria um pacote de
balas para nós.
Que os pais signifiquem proteção
aos seus filhos. Que lhes signifique abrigo.
Meu pai está de parabéns.
Cumpriu e cumpre muito bem sua
missão.
Até hoje.
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