Minha mãe com meu pai na roça,
perto de isolados em função da pandemia. Ela lhe pede para ir ao mercado para
umas comprinhas, na Capela. Incluindo, alho. Pergunta-lhe se precisa anotar. Ele
faz não com a cabeça, com veemência. - mas não me esqueça do alho, hein! Ela
adverte. Meu pai endurece a boca. Não gosta que ela lhe sugira ser muito
"esquecido". Voltando da cidade, meu pai deixa a caixa com as
encomendas sobre uma mesa. Sai para ver uma vaca chegadinha. Dali a pouco,
escuta - TADEEEEEEEEEEU! Ele levanta a cabeça de jeito a suspender a orelha
direita, a que escuta melhor. Eleva as sobrancelhas. Que será que fiz de
errado, pensa. - Tadeu, seu miolo mole. - Mamãe diz. Tem uma mão na cintura numa postura inquisidora. Meu pai
cresce os olhos como dissesse "o que foi"? - Cadê o alho que falei
que era o principal? Meu pai faz postura de susto. Olha para cima. Não se
lembra de haver pedido o alho. Por que lá no mercado é assim. Você faz a
encomenda. Sai para outras coisas. Eles colocam tudo numa caixa. Depois a gente
pega a caixa. Ele não conferiu. Ele não lembra se pedir, mas tem certeza de que
não conferiu. Ali, diante da minha mãe com os olhos injetados de eletricidade,
ele pensa que era melhor ficar quieto. - Eh, Tadeu! Você parece criança. Não faz
nada certo - mamãe diz. Sai pisando alto. Mais tarde meu se depara com ela
usando alho no preparo do feijão. Ele chega mais perto, para conferir. Podia
não haver alho no tempero do pilãozinho que ela socava. Mas havia. Ele sente. Ele puxa o ar. Minha mãe olha
para ele, irritada, como dissesse o que foi? Ele olha para casquinhas de alho
perto de taipa do fogão como asinhas de borboletas. Estica o beiço na direção
delas. - é o alho que você comprou, - mamãe diz, voz contrariada. Meu pai
desmancha a cara como dissesse “ué, mas eu trouxe então”? - A réstia apareceu
aí, atrás da porta. - ela diz. - decerto que eu mesma tirei da caixa e pus, sem
perceber. - Ela parece odiar aquilo que diz. - Também... é tanta coisa para eu fazer.
Por que é tudo eu, tudo eu. - Ela diz, disparando as palavras - Até faço coisas
sem ver. Essa maldita quarentena está me pondo louca, Tadeu! eu gosto de conversar,
Tadeu. Conversar, entende. Você fica aí, com essa cara de mudo... meu pai sai
sorrindo. Minha mãe morde os lábios. Ela detesta estar errada. Ainda mais numa
situação de caduquice daquelas. Um canto de joão-de-barro que vem do pomar lhe
parece gargalhada. Ela faz um chiste com a boca. Oh, diacho!
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