Mamãe diz para eu moer café. Eu
protesto, mas vou. Como sempre. Deixo o cachorro Jaú, que abana a cauda
querendo brincar mais. Ouço o cocoricado gargalhado das galinhas como rissem de
mim. Pego duas medidas (com uma cuinha) de café torrado na lata com desenho de
passarinhos. Despejo. Meu braço põe força no giro. Vou olhando os grãos descendo
pelo copinho do moinho como num sumidouro. Aquele barulho triturado, crepitante.
Os grãos sumidos reaparecem pó. Eu canso. Paro. Um vento zoando, zoando faz
barulho de cachoeira nas pereiras dos lados do Antônio Rocha. As galinhas se
assustam, correm. Vai chover, mamãe diz. Papai concorda. Começo a girar
novamente com o outro braço. Mamãe reclama que não gosta de galinhas brancas. Porque
são vistas de longe pelo gavião. Papai sorri da implicância dela. Meu outro
braço começa a doer também. Diminuo a velocidade. A repetição, por menor que
seja, enfada a gente. Mamãe grita: já acabou menino. Acelero. O cheiro se
alastrando pela cozinha. Dou pela correria atrapalhada de mamãe e papai
guardando coisas. Eles riem porque o Jaú achando que papai brincava trançou-se
entre as pernas dele. Papai quase caiu. Certamente o riso fácil era pela chuva
que vinha. Principalmente depois de uma estiagem, na roça chuva é benção. Caía
cada pingão. Espiei para os lados do pomar. Tudo cinza, riscado. O Jaú se
protegia embaixo do chuchuzeiro. Orelhas relaxadas. Traseiro no chão e o resto
do corpo levantado. Eu assoviei. Ele agitou o rabo, arrebitou as
orelhas. Mamãe gritou: pronto menino. O gato ali na cozinha comigo parecendo hipnotizado com a chuva, assustou-se com mamãe. Pulou da taipa do fogão de um jeito atrapalhado. Eu gargalho: "gato besta". Cheiro de pó de café... Cheiro de terra molhada... Ah, doces cheiros da infância
na roça.
Nenhum comentário:
Postar um comentário